sábado, 2 de julho de 2011

Para entender-se

"Não é que eu estive embriagada, nem mesmo álcool eu tenho bebido, mas sabe quando te da aquele desatino? Acho que parei pra pensar e andando pelos labirintos dos meus pensamentos acabei me perdendo de forma tal que nem um sinalizador poderia me livrar do meu devaneio, admito: perdi-me ao chegar da noite. Creio que enquanto o sol baixava alguém se apossava de mim, e não era qualquer um, era eu mesma, mas uma parte tão esquecida que custei a me reconhecer ali. Saí da varando indo pra lugar nenhum e acabei na areia da praia, numa loucura tão real que nem percebi quando tirei minhas sandálias e segui descalça mesmo, sentindo a areia fria nos meus pés relando nos meus dedos. Andei lentamente escutando o barulho do mar e enquanto eu me perdia em pensamentos meus corpo agitava-se, sei que é loucura relatar assim, mas te digo para não se assustar, comecei a correr tão sem rumo querendo fugir de mim mesma e é uma pena que isso seja impossível, corri do meu egoísmo, da minha mesquinharia, do amargo que até ontem eu sentia em meu peito, do veneno que cultivei em minha saliva, do sonho que eu enterrei antes de vivê-lo, corri mesmo da minha tristeza que jazia ali, do meu ser fraco, da minha alma envenenada pela humanidade. Corri de mim, corri das pessoas, corri do mundo, corri sabendo que a única forma de correr de todos meus fantasmas me custaria caro, mas fui assim mesmo, fugi covarde entrando no mar, primeiro até a cintura, depois me joguei entre as águas. Entreguei-me na tentativa de fugir verdadeiramente de tudo, mas quando o ar me faltava eu me impulsionava para superfície e respirava, trapacei minha fuga e quando já estava cansada voltei molhada para a areia, deitei-me no frio dos grãos de areia observando a lua e ali passei a noite. Acordei cedinho com os primeiros raios de sol, era tão bonito amor que quase chorei e esse outro pedaço de mim eu nem sabia que existia, o sol nascendo depois de tanto devaneio me trouxe a ideia de recomeço. Te contei tudo pra que assim você possa entender que eu não quero ficar perdida em mim mesma, vou rodar por aí procurando todos os meus pedaços e se um dia eu conseguir juntar todas as minhas personalidades em uma só, eu juro meu bem que volto, mas peço que não me espere até porquê eu posso usar minha vida inteira em busca de mim mesma. Não pense jamais que estou fugindo, agora meu amor é que resolvi parar de desertar. Vou sentir tua falta, mas tem muitos pedaços de mim que ainda nem mesmo te conhecem, estão ocultos demais. Fica bem, vê se te alimenta. Beijo meu amor."
                       
Marcos terminou de ler a carta que recebera de sua namorada perplexo. Estava acostumado com o distanciamento que Milena criava em algumas situações, mas nunca imaginara uma ação tão súbita quanto a que estava presenciando. Sentou-se na cama olhando para o teto. Milena agora tinha se entregado a estrada, pegou a moto e foi sem rumo em busca de respostas, respostas essas que ainda sequer compreenderam a pergunta.